Na história de Claudia Ravazi, Santa Maria tem um lugar de destaque. Ela nasceu no Coração do Rio Grande há 48 anos, e é moradora do Bairro Perpétuo Socorro desde então. Em um período turbulento na adolescência, acabou perdendo o movimento das pernas. Alguns meses depois, deu à luz ao filho Frederico Ravazi. Apesar de enfrentar problemas de acessibilidade rotineiramente, não trocaria a cidade por nenhuma outra. Formada em Serviço Social, em 2008, pela Universidade Franciscana (UFN), hoje, é servidora pública federal. Foi em Santa Maria, também, que ela encontrou o amor: tem união estável com Virgilio Magalhães há 14 anos. Juntos, construíram a casa onde moram, distante apenas uma quadra da residência em que cresceu. Paratleta da Sociedade Concórdia Caça e Pesca (Socepe), conquistou o quarto lugar na Super Copa de Bocha Adaptada em 2019.
Diário - Qual a sua relação com Santa Maria?
Claudia Ravazi - Nasci e vivo aqui. Conheço vários lugares e, apesar de todas as dificuldades que enfrentamos, ainda é a cidade que me dá prazer em estar.
Diário - Como foi crescer no Bairro Perpétuo Socorro?
Claudia - Meus pais foram uns dos primeiros moradores da rua onde morei quase toda vida. Minha mãe foi costureira da extinta cooperativa da viação férrea e, meu pai, foi pedreiro. Ele construiu nossa casa, tendo os morros como pano de fundo. Quando foi possível, eu e meu companheiro construímos nossa casa, e a certeza era o desejo de continuar morando aqui.
Diário - Qual foi a situação mais difícil que você já passou?
Claudia - Enfrentar preconceito e desconfiança sobre a minha capacidade, logo que voltei a estudar e a trabalhar. Um exemplo: se tivesse mais alguém no mesmo ambiente de trabalho, algumas pessoas optavam por falar com essa outra pessoa, mesmo que, ao final, a tarefa tivesse que ser desempenhada por mim.
Diário - Como superou ela?
Claudia - São enfrentamentos diários. Porém, hoje em dia, pouco me afetam. Isso passa pelo amadurecimento coletivo em relação às limitações que todos têm. Perdi muito tempo tentando provar que eu era capaz de algumas coisas. Superei realmente quando me dei conta de que o mais importante era eu estar feliz.
Diário - O que Santa Maria precisa aprender ainda sobre acessibilidade?
Claudia - Santa Maria precisa aprender uma coisa bem simples: olhar para o outro e se imaginar naquela situação. Usando uma cadeira de rodas, manobrando um carrinho de criança, um andador, uma bengala, etc. Santa Maria precisa aprender a usar o bom senso, sem moderação. Não só elogiar grandes centros, mas agir para que possamos nos tornar uma referência nesse aspecto.
Diário - Quais os maiores desafios que você encontra para se locomover?
Claudia - Sem dúvida, o passeio público. O que já foi feito é bom, mas, ainda é pouco. Precisamos de transporte mais abrangente, transportadores (táxis ou aplicativos) mais conscientes e preparados. Não são raras as vezes em que tive a corrida recusada quando falei que era cadeirante, principalmente, em dias de chuva. Alguns perguntam se eu não tenho familiares que possam me transportar, ignorando meu desejo de ser independente. Se eu conseguir um táxi/aplicativo e quiser assistir a um show, dependendo do lugar, eu não passo da entrada. Se passar da entrada, eu preciso ficar sempre no mesmo lugar e não posso beber. Se beber, não posso ir ao banheiro. Enfim, são desafios que só podem ser solucionados por alguém que já esteve na mesma situação, ou tem algum familiar com deficiência ou mobilidade reduzida, ou consegue se colocar no meu lugar.
Diário - Como passa o tempo? Quais seus hobbies?
Claudia - O meu tempo livre é dividido entre a casa, bocha em cadeira de rodas, a consultoria virtual de algumas marcas de cosméticos e um labrador baio.
Diário - Hoje, o que Santa Maria representa para você?
Claudia - Hoje, ela representa uma cidade com muito potencial e pouca ação. Entendo que muito ainda deva ser feito e que tem prioridades, mas as pessoas têm que entender que tudo está interligado. Bem-estar, saúde, educação e satisfação.